Percepções de si mesmo
Necessitamos ser amados.
O orgulho é uma espécie de disfunção na capacidade de perceber-se amado.
Portanto, o orgulho pode ser o estado de uma alma insegura, a manifestação de
uma carência que desconfia jamais ser suprida.
Vive-se como se a vida
fosse um concurso. Só que o orgulhoso procura, além disso, não apenas ser
classificado, mas ser o primeiro. Afinal, ele não pode viver sem provar a si
mesmo e exibir aos outros que ele é o melhor.
Geralmente o orgulhoso
não tem consciência de que é assim. Entende-se apenas como esforçado, bastante
dedicado, que se interessa inteiramente pelas coisas, que não desiste -- enfim,
um brasileiro superior. A razão pode ser um forte apoio para justificar-se e
defender-se inconscientemente.
O que predomina naquele
que é tomado pelo orgulho é a competição. E quem compete, necessariamente,
precisa observar o outro. Vive prestando atenção no desempenho do próximo a fim
de superá-lo. Ou seja, a comparação é como o ar que ele respira. Não consegue
viver sem isso, está o tempo todo vendo e julgando.
O orgulhoso é compelido
a insinuar seus feitos todo o tempo. Ofende-se se não é mencionado.
Considera-se facilmente injustiçado e os demais, ingratos, quando se trata, na
verdade, de dificuldades suas.
Dominado pelo orgulho,
assume um jeito de viver em que a autossuficiência se revela, às vezes,
discretamente, em outras ocasiões, explicitamente. Assim seus dias ficam mais
cansativos, pois vivem acorrentados ao peso de não poder pedir ajuda. Sentem
como se isso fosse uma vergonha mortal.
Tudo isso compromete sua
capacidade de gratidão e contentamento. O orgulhoso vive inconformado com a
falta de reconhecimento dos que o cercam quanto a tudo que já fez. Chega a
julgar o próprio Deus e vê-se no direito de explicar por que percebe que de
certa forma Deus está em dívida com ele. Em última análise, pode concluir que
Deus não é de fato confiável, pois não é justo. Sendo assim, vive uma solidão
cruel, que se esmera por disfarçar.
A alma adoecida pelo
orgulho acaba por viver seus dias miseravelmente. Vê inimigos o tempo todo,
sente uma perseguição implacável em seu cotidiano. Portanto, envelhece com
raízes de amargura, com dureza ímpar, com sofrimentos desnecessários. A distorção
na maneira de olhar e interpretar a si mesmo, os outros e o seu contexto enruga
a alma de tal maneira que poucos vestígios sobram da imagem de Deus, o Criador.
Por Tais Machado,
paulistana, é psicóloga clínica e professora em seminários teológicos. É
secretária nacional de capacitação da Aliança Bíblica Universitária do Brasil.
Publicado originalmente em Ultimato
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